A CANÇÃO DO EXÍLIO EM NOVA VERSÃO E UM POEMINHA DE JUSSARA N REZENDE

O poema “Canção do exílio” (1843), de Gonçalves Dias, talvez seja o texto mais parodiado de nossa literatura:

 

“Minha terra tem palmeiras

Onde canta o sabiá;

As aves que aqui gorjeiam,

Não gorjeiam como lá.”

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O fato de os versos redondilhos (de 7 sílabas métricas) serem naturalmente sonoros e cadenciados e convidarem à declamação, bem como a presença de rimas oxítonas (“lá”, “cá” e “sabiá”) são, certamente, as razões mais evidentes para que tenha o poema caído no agrado público. Assim, ao longo do tempo, mas especialmente após o advento do Modernismo (o poema de Gonçalves Dias pertence ao período do Romantismo), foi o poema retomado em inúmeros outros poemas. Os fragmentos abaixo se sobressaem entre centenas de outros, de poetas menos conhecidos, todos a resgatarem, sob algum viés, os versos de Gonçalves Dias:

 

“Se eu tenho de morrer na flor dos anos/ Meu Deus! Não seja já;/ Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,/ Cantar o sabiá!” (“Canção do exílio”, de Casimiro de’ Abreu);

 

“Minha terra tem palmares/ Onde gorjeia o mar…” (“Canto de regresso à Pátria”, de Oswald de Andrade);

 

“Minha terra tem macieiras da Califórnia/ onde cantam gaturanos de Veneza” (Canção do exílio”, de Murilo Mendes);

 

“Meus olhos brasileiros se fecham saudosos./ Minha boca procura a “Canção do exílio”./ Como era mesmo a “Canção do exílio”?/ Eu tão esquecido de minha terra…/ Ai terra que tem palmeiras/ onde canta o sabiá.” (“Europa, França e Bahia”, de Carlos Drummond de Andrade);

 

“Um sabiá/ na palmeira, longe.// Estas aves cantam um outro canto…” (“Nova canção do exílio”, de Carlos Drummond de Andrade);

 

“Agora chamarei a amiga cotovia/ E pedirei que peça ao rouxinol do dia/ Que peça ao sabiá/ Para levar-te presto este avigrama:/ “Pátria minha, saudades de quem te ama…” (“Pátria minha”, de Vinícius de Moraes);

 

“Minha amada tem palmeiras/ Onde cantam passarinhos/ e as aves que ali gorjeiam/em seus seios fazem ninhos” (“Nova canção do exílio”, de Ferreira Gullar);

 

“Minha terra não tem palmeiras…/ E em vez de um mero sabiá,/ Cantam aves invisíveis/ Nas palmeiras que não há.” (“Uma Canção”, de Mário Quintana);

 

“lá/ ah!/ sabiá…/ papá…/ maná…/ sofá…/ sinhá…/ cá?/ bah!” (“Canção do exílio facilitada”, de José Paulo Paes);

 

“Vou voltar/ Sei que ainda vou voltar/ Para o meu lugar/ Foi lá e é ainda lá/ Que eu hei de ouvir cantar/ Um sabiá” (“Sabiá”, de Chico Buarque de Hollanda);

 

“Sonhada terra das palmeiras/ Onde andará teu sabiá?/ Terá ferido alguma asa?/ Terá parado de cantar?” (“Terra das palmeiras”, de Taiguara);

 

“Minha Dinda tem cascatas/ Onde canta o curió/ Não permita Deus que eu tenha/ De voltar pra Maceió./ Minha Dinda tem coqueiros/ Da Ilha de Marajó/ As aves, aqui, gorjeiam/ Não fazem cocoricó.” (“Canção do exílio às avessas”, de Jô Soares);

 

“Minha terra tem Palmeiras,/ Corínthians e outros times…” (“Outra canção do exílio”, de Eduardo Alves da Costa);

 

“Minha terra não tem palmeiras/ E nem sabiá a cantar/ As aves que aqui gorjeavam/ já foram para outro lugar.” (“Canção do exílio”, de Raquel Maythenand);

 

“Minha terra tem castanheiras, ouço o bugio e o curió/ Nas estradas tem atoleiros, no verão levanta pó…” (“Canção do martírio”, de Daniel Chaves).

 

Entre estes poemas ilustres hoje se junta o “A minha terra”, de Fernando Moura Peixoto:

 

 

 

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O interessante nas paródias é a retomada dos versos ufanistas de nosso poeta romântico numa perspectiva crítica, como se pode perceber no poema de Fernando Moura Peixoto.

As fotografias do Cristo Redendor são, também, de autoria de Fernando (feitas da janela de seu apartamento, em Botafogo) que é jornalista, fotógrafo e historiador e, ao falar de “sua terra”, fala do Rio de Janeiro nos dias atuais.

Ao comentar a primeira imagem acabei por compor um poeminha que, agora, casado à imagem, apresento aqui:

 

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Beijo&Carinho,.

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Respostas de 15

  1. Bom dia, colega Jussara!
    Muito bacanas os diferentes modos de ver as coisas. Moura Peixoto é bem realista em suas palavras. Infelizmente, é bem assim que acontece hoje em dia.
    Ei, moça!
    Minha primeira postagem de 2017, já está na rede. Passe lá em "GAM Dolls (2)" pra conferir.
    Te desejo um novo ano supimpa, repleto de coisas boas.
    Abração pra você! 🙂

  2. Concordo plenamente, Jussara, a beleza está nos olhos de quem vê e não no objeto observado. E como a postagem aborda a intertextualidade me lembrei de um texto lindíssimo de Rubem Alves: A complicada arte de ver. Conhece?

    1. Conheço, sim. Silmara. Houve um tempo em que eu lia Rubem Alves como respirava, rs. Cheguei a fazer um minicurso com ele sobre “A arte e a magia de contar estórias”, em Campinas, e fui assistir a sua participação numa série de debates promovidos pela Folha em parceria com a PUCSP, os Diálogos Impertinentes… em que Rubem Alves e Darcy Ribeiro debateram sobre a Utopia. Tem gente que não deveria morrer nunca… ainda bem que o que escreveram ficou. Abraço!

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