O EROTISMO DE GILKA MACHADO

A carioca Gilka Machado foi contemporânea de Cecília Meireles, mas ao contrário da escritora de Viagem, optou por versos audaciosos, que refletem sobre a paixão e seus embates no corpo feminino. Foi demais para a época (seu primeiro livro, Cristais partidos, foi publicado em 1915). Gilka caiu no ostracismo e só muito recentemente seus versos têm sido recuperados do esquecimento e avaliados à luz dos novos tempos.

A poetisa, que se lança em versos preocupada com o uso dos sentidos como forma de percepção do mundo – e, assim, enfatiza o silêncio e o “sonoro rumor do choque dos cristais”, a presença da luz, das cores, dos perfumes e da maciez das coisas – evolui para uma poesia claramente erótica em Meu glorioso pecado, livro de 1928. Nessa obra os sentidos servem para perceber o amado-amante, dono de olhos que sugerem maciezas e doçuras e que provocam no eu-lírico (a voz que fala nos versos), por sua proximidade, reações que se assemelham ao estado de embriaguez. Essa voz, contudo, que se ocupa da paixão, apresenta-se dividida entre o prazer que entontece e a culpa pela vivência desse prazer, o que reflete a condição paradoxal da mulher, marcada pela busca da liberdade e pela convivência com valores tradicionais. Tal contradição, já anunciada pelo próprio título do livro, marca os versos de Gilka Machado, dosando-lhe a volúpia e a audácia.

No poema “Há lá por fora um luar”, do qual apresento a seguir um excerto, nota-se a divisão do ser exposta numa sequência de versos repletos de paradoxos:

 

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A natureza representada de forma romântica é o que sustenta, no poema, as imagens da mulher dividida entre o pecado e o prazer. Porque “lá por fora” o luar é um “divino pecado” é que o eu do poema se põe a desejar a presença do amado para “agora”, para a vivência do gozo que o seu corpo “amado e amante” anseia.

Esse amor, porém, que repele o outro e o quer, na mesma intensidade, indica que a mulher desenhada nos versos reúne em si mesma a contradição entre pecado e prazer.  A vivência das palpitações do “gozo”, portanto, aparece nos domínios do sonho (“fugindo-te e sonhando”), espaço em que a mulher pode ousar e participar ativamente do encontro amoroso.

Nos primeiros versos do poema a repetição da condicional se já indica que são conjecturas todos os versos seguintes.

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Gilka Machado
 
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Respostas de 9

  1. Boa noite, Jussara, ainda bem que em sua época não haviam os machões de agora. Foi mulher, foi ousada e atrevida, pois colocou em versos as emoções que sentia.
    Uma forma de repudiar é não lhe dar os créditos que merecia, foi relegada ao ostracismo, hoje relendo a obra, já olham com outros olhos. E seus versos são lindos. Gratidão pela partilha linda.
    Gostei da nota, Jussara, nada mesmo tem lógica…
    Feliz sexta feira, abraços carinhosos
    Maria Teresa

  2. Jussara,

    Que lindo texto. Não me lembro de ter ouvido falar de Gilka Machado, mas me apaixonei pelos versos. Obrigada por compartilhar. Linda a forma que você nos apresentou essa poetisa. Vou procurar conhecer mais sua obra!

    Um grande abraço,

    Drica.

  3. Boa tarde, cara colega Jussara!
    Bem "saidinha" essa moça. Nota-se mesmo erotismo nas palavras, elas chegam a desenhar cada cena. Kkk
    Ei, moça!
    Apareça lá em "GAM Dolls (2)" e encante-se com mais uma postagem supimpa. Venha ver a repaginada que dei em três figuras muito especiais.
    Ficarei feliz com sua visitinha e comentário, sempre tão gentis.
    Feliz Primavera e um abração pra você! 🙂

  4. Ótima recomendação!
    Quanto à periodicidade blogueira, o Sr. Tempo está cada vez mais apressado e implacável com as mentes contemplativas e especulativas dos artistas e sonhadores amadores!
    No meu blog só consigo manter o ritmo porque nivelei por baixo, com uma publicação mensal, mesmo assim programada antecipadamente.

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