A DUVIDOSA AUTORIA DOS TEXTOS QUE CIRCULAM NA INTERNET

Não sei se por ignorância (quem desconhece ignora) ou a fim de conferir maior credibilidade a um texto anônimo, algumas pessoas fazem circular pela rede textos atribuídos a Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Shakespeare, Chaplin, Mário Quintana, entre outros (esses parecem ser os escritores mais visados), dos quais os pretensos autores jamais ouviram falar, não escreveram e nem desejariam tê-lo feito e, caso soubessem que são a eles  atribuídos dariam reviravoltas nos túmulos onde se encontram. 
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A sério: são muitos os textos de autoajuda conferidos a Clarice, por exemplo, que nunca saíram da máquina de escrever que ela usava no colo. Escritora existencialista, Clarice Lispector criou textos de profunda densidade psicológica, o que a levou a quebrar a ordem cronológica dos acontecimentos e a romper com os limites espaço-temporais, subvertendo a estrutura tradicional da narrativa. É possível perceber, apenas por essas características, que sua escrita não é tão fácil como fazem supor os pensamentos que circulam pela Internet como sendo dela. Embora quase impenetrável em alguns momentos, o texto de Clarice é iluminador depois de conquistado, marcado pelo fluxo de consciência – que procura desvendar o universo mental da personagem – e pelos momentos de epifania, de revelação da vida a partir de fatos cotidianos e até banais. Não, ela não escreveu autoajuda, nem poesia, por mais que sua prosa até seja poética em alguns momentos.
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De modo semelhante, o poeta modernista português, Fernando Pessoa, não escreveu textos bobinhos sobre amizade. Impactado pelas correntes de vanguarda que corriam a Europa de seu tempo e indagando-se sobre o próprio eu e seu lugar no mundo e na literatura, Pessoa divide-se em outros eus que lhe conquistam o privilégio de ser todos em um só e ao mesmo tempo o colocam no abismo de não saber quem é uma vez que, sendo muitos, despersonaliza-se e já não é ninguém.
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A complexidade da literatura criada por esses escritores distancia-os dos textos mal escritos e cheios de lugares comuns que pretendem alguns terem sido criados por eles. Não foram. Da mesma forma que o escritor, com todo o direito, procura defender a autoria daquilo que escreveu, esquiva-se, se possível, da paternidade de textos ruins que jamais pensou em escrever.  Se ele, o escritor, já não está entre nós (como não estão aqueles que citei aqui) cabe-nos o dever de, em respeito à sua memória, talento e trabalho, defendê-lo daquilo que não escreveu.
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Para isso aconselho a publicação apenas de fragmentos de livros efetivamente lidos, com referência bibliográfica, bem como o repúdio aos slides com textos cheios de erros de ortografia e de conteúdo questionável. Você tem certeza de que o referido autor disse tal coisa? Sabe a obra em que o disse? Ótimo; com certeza outras pessoas vão se encantar com o dito. Não tem certeza de que foi escrito pelo escritor X, nem sabe a obra em que tal pensamento se encontra? Então delete e esvazie a lixeira; não vale a pena repassar.

 

Beijo&Carinho,
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Respostas de 24

  1. Esses hoax são chatos, né? Tudo bem, até entendo que a maioria das pessoas não reconheçam a impossibilidade do texto ser deste ou daquele autor, mas , o pior éque vejo colegas minhas de faculdade, jornalistas famosas distribuindo as mentiras e ainda dizendo "ah, o Chico sabe tudo!"
    Aí eu me sinto mal por eles! O veríssimo, tadinho.. já até vi acróstico atribuído à pobre da Clarice. Fernando Pessoa pode enganar porque ele se meteu em todas as searas, não aconselhando, mas palpitou sobre tudo :- ) Vou te confessar.. a internet me fez me decepcionar com muita gente.

  2. Oi Jussara!
    Já li sobre alguns textos com essas atribuições equivocadas…
    O Veríssimo deu entrevista falando sobre um tal texto que cismaram ser dele!
    Algumas pessoas recebem e repassam emails, sem prestar atenção ao conteúdo.
    É o mínimo!
    Ótimo alerta!
    bjs, ótimo dia

  3. É preciso bom senso e um mínimo de conhecimento para não aceitar como verdadeiro e autêntico tudo o que encontramos. Porém, não podemos deixar de reconhecer o poder da internet como meio de divulgação e de acesso à informação. Para onde levo o meu "clique" é de minha inteira responsabilidade e saber ler e compreender é fundamental. Sobre este tema vi outro dia uma citação de Machado de Assis que dizia + ou – assim: "Não confie em tudo o que você encontra na internet". Desce o pano…

  4. AI, COLEGA… EU ODEIO A NOVA REFORMA ORTOGRÁFICA! É UMA VERDADEIRA PIIIIIII!!!
    ADORO O HÍFEN NAS PALAVRAS COMPOSTAS, O TREMA… CADÊ TUDO ISSO??? TANTA COISA PRO GOVERNO SE PREOCUPAR, FOI MEXER NO QUE ESTAVA QUIETO. ESSA "SIMPLIFICAÇÃO" DOS TERMOS, É MUITO TOSCA, DEUS NOS LIVRE!
    ONDE JÁ SE VIU ESCREVER IDÉIA SEM AGUDO?
    MICROONDAS, SEPARADO?
    GIRASSOL, COM HÍFEN?
    É O FIM!
    SOU MUITO SAUDOSISTA. AMO A LÍNGUA DO JEITO QUE APRENDI. ESSA HISTÓRIA DE MUDAR TUDO É FOGO DE PALHA.
    QUERO SÓ VER SE ATÉ 2016 VÃO MODIFICAR TODOS OS LIVROS DO PAÍS CONFORME QUEREM. VÃO NADA!
    FALTA DO QUE FAZER, VIU?
    ABRAÇÃO, COLEGA!
    AH… DÊ UMA ESPIADINHA NA MINHA NOVA BONECA RESTAURADA. "CUTI, PÁ MAI DI METRU"!KKK

  5. Oi Jussara!
    Obrigada pelo post, e pela informação, bom saber, pois eu mesma tenho publicado alguma coisa em minha página; daqui pra frente prestarei mais atenção.
    Vou começar reciclando o que tenho salvo nas minhas pastas.

    Fiques com Deus, amada! (:
    Beijos!

  6. Oi, Ju,

    Nunca pensei que diria isso: mas hoje acho até bom que as pessoas publiquem os textos "falsos" porque isto denuncia logo (a mim, pelo menos) a ignorância delas. Há pessoas na Internet que querem se passar por cultas ou amantes de livros, mas que desconhecem minimamente as caracteríitcas de certos autores, e por isso não têm pejo de publicar os textos que supõem ser dos autores que alguém assinalou como "autor", rsrs. Você disse tudo neste post, rsrs.

    Um beijo e boa noite, querida!

  7. Jussara:
    Cada autor tem seu estilo próprio, e uma "marca" que o distingue dos outros.
    Desses que você citou, como exemplos, a Clarice, no meu ponto de vista tem como marca a acidez, a realidade crua e nua e até uma certa dose de objetividade.
    Quintana, ao contrário, possui doçura profunda como sua marca registrada.
    Shakespeare, devido a época em que viveu, tem textos mais complexos e densos, mas que por tratar do amor, são de fácil entendimento.
    Então, quem confunde ou atribui a esses escritores frases, citações ou textos que são de sua autoria, realmente desconhece as obras deles.
    Bjs.:
    Sil

  8. Concordo plenamente, os pseudo-filósofos que surgem diariamente na internet massacram nossos mais conceituados escritores. Outro que cai nas graças da terra-de-ninguém que é o ambiente virtual é Luís Fernando Veríssimo, qualquer piadinha de mau gosto é creditada como crônica dele. Haja paciência!

  9. Estou aprendendo com a autora do post e com todos os comentaristas. Bem, quanto a isto, fico sossegado e defendo que se deve dar a CESAR O QUE É DE CÉSAR E A DEUS O QUE É DE DEUS. O quê acabei de dizer, transfiro os créditos para JESUS CRISTO, porque tenho a certeza de que foi ele quem o disse.
    Muito legal este blog! É uma escola que não quero me afastar jamais.
    Muito obrigado, por tudo…
    Fique com Deus!…

  10. Legal esse alerta Jussara, como não tenho condições de identificar todos como sendo realmente desse ou daquele autor, antes de repassar vou procurar me informar melhor, bjs.

  11. Oi Jussara
    Muito bom seu texto, é minha primeira vez por aqui, mas já estou te seguindo! Eu li Clarisse Lispector, e realmente não é a cara dela escrever essas frases de impacto que circulam no face, como eu não sou uma expert no assunto, eu fico na minha, mas pelo jeito você se aprofundou nisso, fico contente em aprender um pouco mais, seu blog é enriquecedor, gosto de estar sempre apendendo!
    Bjos. Fique com Deus!
    http://ashistoriasdeumabipolar.blogspot.com.br

  12. Oi Jussara, é a Vi,já li alguns livros desses autores,mas como não estudei sobre o estilo deles, então é muito fácil ser enganada..e já devo ter repetido frases, achando ser de autoria deles, quando enviava um cartão virtual para alguém, querendo fazer um carinho..chato isso.
    O melhor é escrever a frase ou texto que gosta ou acha legal e escrever desconheço o autor, assim evita constrangimento.
    Boa semana,beijos,Vi

  13. Jussa, bem a propósito o seu post, já que pipocam textos cuja autoria é atribuída a algum escritor ou poeta que não os escreveu. É uma babaquice, desculpe o termo, repassar tais textos sem ao menos consultar a autoria. Um dia desses, não me recordo bem, me enviaram um link que dizia que fulano de tal havia morrido numa data tal, só que eu sabia da morte do fulano que ocorrera um ano antes ou mais. Absurdo. De imediato respondi ao e-mail relatando o fato e a pessoa acabou me pedindo desculpas depois e agradecendo o pito. A internet é uma ótima ferramenta, porém tem que ser bem utilizada, aliás, como tudo nesta vida. Bjs

  14. Concordo plenamente. Ainda não entendo porque pessoas usam estas “artimanhas” para terem seus textos e/ou ideias lidas.
    Que o bom senso não seja esquecido nesta hora.

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