.
.
Li há pouco tempo um depoimento de Miguel Falabella sobre sua formação como leitor. “Eu pedia brinquedos para os meus pais e ganhava livros”, conta ele. “Depois de ler e contar a história ganhava os brinquedos; por isso me tornei um leitor voraz”. Li e pensei: “Que bom que o Falabella encarou assim… outra criança, em seu lugar, talvez passasse a odiar os livros que chegavam antes dos brinquedos desejados”. Pensei o mesmo, há vários anos, quando uma aluna me disse que o “castigo” que os irmãos e ela recebiam, quando faziam alguma coisa errada, era ler um livro. Depois de o livro lido e comentado, acabava-se o castigo. Admirou-me, na ocasião, que o pai dela conseguisse dessa forma que os filhos se apaixonassem pela leitura ao invés de encará-la como algo penoso e enfadonho. Admira-me, ainda, o mistério que envolve o momento em que um leitor é conquistado para sempre. Os estudiosos desse assunto parecem unânimes na opinião de que é importante que as primeiras historinhas sejam contadas por uma voz amada (do pai, da mãe, da avó…) pela criança, que sentirá prazer com essa companhia e com o conto narrado; primeiro passo para que mais tarde seja ela mesma uma leitora.
Foi assim comigo. Lembro-me de ouvir historinhas contadas pelos meus pais desde muito pequena. Tenho, ainda, a maioria dos livrinhos dessa época, nos quais minha mãe registrou meu nome e a data da aquisição. Por essas datas sei que eu tinha entre dois e meio e três anos quando a maior parte desses livros foi comprada. E não são poucos! Eu gostava tanto de ouvir as histórias que por fim, antes de saber ler, já sabia de cor cada linha e ficava brava quando meus pais, propositalmente, mudavam alguma frase ou o sentido geral do conto. Lembro-me de estar aconchegada junto a eles e admirar as nuances de cor nas ilustrações enquanto eles liam as historinhas ritmadas como este trechinho final de Os três porquinhos, que agora me ocorre:
.
.
Mudou de vida o malvado
E, assim, aprendeu a lição.
Não vence na luta a força,
Vence quem é sabidão.
.
.
Posso dizer, como Bruno Bettelhein, autor de A psicanálise dos contos de fadas, que toda a minha vida foi determinada pelo prazer proporcionado pela leitura. Depois que comecei a ler por mim mesma, nunca mais parei. Meu currículo é a história da leitura em minha vida e até minha vida não profissional se moldou em torno da leitura: os livros adquiridos desde os dois anos de idade tinham que se acomodar em algum canto e o cômodo mais amplo da casa foi planejado para eles.
Quando meus filhos nasceram, fiz questão de colocar livros ao alcance deles. Os pais dos coleguinhas me pediam emprestado ou procuravam a biblioteca pública; eu fazia questão de comprá-los para que eles percebessem que era uma coisa boa possuí-los. Antes de dormirem, lhes contava histórias que sei de cor ou lia as que eles escolhiam. Hoje o Gabriel lê muito na internet e, de vez quando, quando o assunto lhe interessa muito, começa a ler um livro. Nunca sei se conclui a leitura: não o pego fisgado por ela, esquecido do mundo – que é o que a leitura faz com quem realmente a ama.
.
.
O leitor faz uma pausa para “voar” pelo espaço sugerido pela leitura. Observe as páginas do livro transformadas em pássaros. Obra do pintor realista iraniano Iman Maleki.
.
.
Já a Ângela se tornou leitora, gosta de livrarias e do prazer de escolher um livro novo… e possuí-lo. Não alterei em nada a educação de um e de outro em relação aos livros, mas eles seguiram caminhos diferentes. Por quê? A escola, as amizades, a experiências e o temperamento de cada um? Não sei. Continua a ser um mistério para mim o que faz com que uma pessoa seja leitora e a outra não. Como a leitura é tão mágica e prazerosa, parece-me estranho que alguém não a ame apaixonadamente, mas gosto de acreditar que todos são leitores em potencial, que apenas não descobriram, ainda, no universo dos livros, aquele que irá fazer de si um leitor para toda a vida.
.
.
.
Beijo&Carinho,
.
.
.
.
.
Crédito da imagem em destaque, aqui.
.
.
.
Respostas de 25
Mãezinha!
Fico feliz de você ter me passado esse amor pelos livros, porque eles são sempre uma boa companhia!
Tenho uma ótima noticia… estou conseguindo ler no ônibus! rs… uma dádiva que infelizmente você não é capaz, pois se conseguisse, teria lido o dobro de coisas que ja leu até hoje, né? rsrs.. pelo tanto que ja teve que viajar!
E realmente, concordo que as vezes há muitos leitores escondidos que ainda não descobriram como amam a leitura, só porque ainda não acharam o texto correto!
"Quem tem um livro nunca fica sozinho".
"Quem lê, viaja.!"
Te amo!
Hehe… Eu fui uma boa mãe ou uma boa professora?
Amo você também, querida!
Jussara, texto lindo e qdo bati os olhos no balcão, também achei q fosse tijolinhos.
bj
Obrigada, Susi! Se eu fosse dona de uma livraria… o balcão seria assim!
Nem tente entender. Minhas filhas são gêmeas e uma tem muito mais prazer na leitura que a outra, mas continuo insistindo sempre.
Tem um sorteio bem legal no blog, espero sua participação:
http://www.deturistaaviajante.com/2012/02/sorteio-cultural-de-2-bolsas-da-deuter.html
Saber da relação gêmeasXleitura de certo modo confortou meu coração mostrando-me que não errei em alguma coisa necesariamente…
Vou lá participar! 🙂
Querida Jussara,adorei sua visita, obrigada pelo comentário e gentiliza!!! Cada vez que passo por aqui, fico encantada e vejo que a leitura continua sendo uma herança e das mais preciosas, Valeu por mais estes momentos tão legais!!! =*
AMOR EM ARTE BRASIL (ainda não sei seu nome..), alegra-me que tenha gostado do post. Venha sempre que puder. É um prazer recebê-la!
Mônica Carabetta! Agora não esqueço mais!
Abraço!
Tem coisas que ninguém explica…Filha de pais com pouco estudo, não tinha o costume de ler na infância. Mas aprendi o gosto pelas histórias contadas como "causos" por minha mãe…Ao ter acesso à biblioteca na escola, descobri que os livros continham causos também,rsrs…E até hoje prefiro ler um livro do que assistir a história filmada, pois a imaginação sempre supera a realização…
Bom feriadão!
Bjnhos,Ana
Ana, querida!
Que bom que repartiu comigo sua experiência sobre a magia de ser "fisgada" pela leitura. Concordo com vc que a nossa imaginação vai sempre além de qualquer filmagem.
Abraço!
Ola Jussara!!
Adorei o post.. e concordo com vc. N consigo visualizar leitura como um castigo! O balcão da livraria é realmente uma graça..
Grande beijo!
Joanna
É Jussara, essa coisa de se tornar ou não leitor é enigmática. Meu pai por exemplo, era um menino pobre, com pais analfabetos e por ele mesmo se tornou um amante da leitura, chegando ao ponto de se aventurar a escrever 3 livros, na lateral do blog faço uma homenagem a ele(já falecido), com um trecho de um escrito dele… já aqui em casa, eu sou a que mais chego perto de ser uma leitora, rs. Marido e filhos nem lembram que livros existem, apenas quando solicitados por trabalhos escolares chegam mais pertinho de algumas páginas… e olha que eu incentivei… vai entender? Bjs.
Oi Jussara, é a Vi,geralmente o gosto pela leitura vem pelo exemplo dos pais, no meu caso foi assim , meu pai e mãe sempre leram muito.
Eu lia muito mais, agora leio menos, muitas vezes não sinto profundidade na historia, e desanimo, parece que tinha uma expectativa que não foi suprida, pois alguns livros só tem interesse comercial, são escritos para baterem recordes de vendagem e não para saciar a inteligência alheia.
Muitos beijos,Vi
Joanna, obrigada! Que bom que gostou! Amei aquele balcão 🙂
Coisa linda a história de seu pai, Anita! Vou ver a homenagem que fez a ele…
Abraço!
Vi, vc tocou num ponto importante. Às vezes um escritor faz sucesso com um romance e a editora já o paga por mais dois que ele deve escrever tendo ou não inspiração, pois tem prazo para isso. Daí nascem as histórias sem profundidade a que vc se referiu. E se a gente vai para a leitura com muita expectativa acaba por se sentir mesmo desanimada 🙁
Abraço!
Abraço!
Jussara, já está lá no blog a divulgação, certo?
Tentei fazer uma postagem com os links de divulgação deste sorteio e de outros que estou participando, mas o pc tava travando e não consegui de jeito nenhum!
Então, coloquei uma lista de links na barra lateral direita.
Programei agora uma postagem explicando isso… ela deve aparecer no blog em breve.
😉
Tá certo, Aninha. Anotei aqui. Obrigada!
Querida Jussara!
Já é madrugada de Carnaval, e já de volta ao nosso "ninho carioca", corro pra internet para tirar o atraso desses dias de viagem… Ainda sobre o efeito da troca de "fuso horário" (onde estávamos era menos 4 horas do que aqui no Rio!), e enquanto o sono não chega, vou fazendo minhas visitinhas nos blogs amigos tão queridos… E que surpresa agradável te encontrar aqui no meio de tantos "livros" e do mistério que envolve tantos leitores! Minha amiga, não imaginas o quanto gosto deste assunto, pois ele, com certeza,já faz parte da minha própria estória. E o mais interessante de tudo, é que quanto mais o tempo passa,mais me encanto com o universo dos livros e seus encantos profundos… E afinal, qual será esta preciosa magia que sai delicadamente das páginas suaves de um livro e nos deixa "prisioneiros" deste mundo de tantas letras e tantas emoções? Será que um dia as teorias realmente explicarão todo este mistério,ou tudo não passa de puro encantamento? Fui criada numa casa com pouquíssimos livros e com pais que não tinham costume de ler pra mim… Tinha muito motivos para não me interessar por livros,mas no entanto, em um dado momento,lá pelos meus 8,9 ou 10 anos,me apaixonei por eles! E sempre fui tão "louquinha" por livros,que sempre os pedia como presente,no lugar de qualquer outro objeto… Qual é a explicação desta paixão inesperada? Até hoje não sei direito… Mas talvez, o que me encanta mais, seja aquele primeiro e especial momento, inexplicável,em que abrimos um livro pela primeira vez, como se estivéssemos entrando num mundo novo,totalmente ávido pra ser descoberto e amado… Uma janela mágica,além do tempo e espaço… Será que "Freud explica"? Sei não… Deve ser pura magia mesmo! (Rs…)
Minha querida,obrigada pelo teu carinho lá no meu bloguinho… Sempre és tão delicada,inteligente e gentil! Saibas que te admiro muito e adoooooro tuas visitinhas!
Beijo grande e um feriado de muita paz e alegria pra vocês!
Teresa
Você também ama artesanato, e eu também amo livros!
Sou daquelas que até chora quando acaba a história! rsrsrsr
É um prazer que poucos sabem aproveitar!
Vou acompanhar seu blog! 😉
Jussara, tenho certeza que seu post fez lembrar a muitos de nós como foi que começamos a gostar dos livros… Para cada um é diferente, mas com certeza pra todos ler é conhecer, é aprender, é companhia: é um prazer. Na minha experiência, porêm, notei sempre que prefiro ler os livros na língua original, seja espanhol, inglês ou português… Sei que as vezes posso perder assim algumas palavras e tal, mas disfruto mais a leitura que se for de uma traduçao. Acha que isso faz sentido? Nao sei… 😉 Beijinho,
Edelweiss
Teresa,
amei a referência que fez aos livros como "janelas mágicas", espaços além do espaço, tempo além do tempo… Lindo! E é isto mesmo que são!
Abraço!
Aninha, no post "Almofadas que contam histórias" misturei artesanato e literatura… Dê uma olhada lá…
Será um prazer tê-la aqui!
Querida Edelweiss,
acho que faz todo sentido. É uma pena que a gente não domine todas as linguas, ou que todas não possam ser uma. Nunca aceitei a tradução de Guimarães Rosa para outro idioma. Ele criava neologismos, revitalizava palavras em desuso na língua portuguesa, grafava o linguajar do homem do interior de forma a transmitir na escrita a fala do mineiro perdido pelo interior mais esquecido, no meio do mato. Para perceber todo o trabalho linguístico do autor, só quem conhece de fato a lingua portuguesa. Não sei o que os tradutores inventam para verter esse conteúdo riquíssimo para outras línguas, mas seja o que for, discordo. É preciso saber português para ler Guimarães Rosa. E penso que cada língua deve ter razões semelhantes…
Abraço!