O JESUS QUE EU NUNCA CONHECI – LIVRO DE PHILIP YANSEN USA EXEMPLOS LITERÁRIOS PARA EXPLICAR A GRAÇA DE DEUS

Anos de escola dominical, de igreja, de leitura bíblica podem dar a impressão ao crente (uso a palavra em seu sentido original = aquele que crê) de que ele já sabe o que precisa saber sobre a Bíblia e sobre Deus. De seu trono na eternidade o Pai deve lançar um olhar cheio de misericórdia para esse filho que, afinal, depois de tanto tempo e leitura, sabe ainda tão pouco!

 

YANSEN, Philip. O Jesus que eu nunca conheci. Traduzido por Yolanda M. Krievin. São Paulo: Vida, 2004, 325 p.

 

Ler O Jesus que eu nunca conheci, de Philip Yansey, é, de certo modo, colocar em cheque a visão clichê que possivelmente temos, influenciados que fomos desde sempre pela figura dócil de Jesus vendida pelas  imagens e pelos filmes a propósito deste personagem divino e histórico que, muito além do que costumamos pensar,  conviveu com as pessoas de seu tempo, olhou-as nos olhos, conversou com elas e a elas revelou sua humanidade e sua missão divina, foi arguto e compassivo, criativo, carismático, educado, desafiador e surpreendente – não sem razão multidões o seguiam e ficavam dias seguidos ouvindo seus ensinamentos.

 

“Perdoa-os, Pai”, tela de Akiane Kramarik

 

Cristão desde a infância, o autor revela que durante o período em que cursava a faculdade, muitas dúvidas sobre a vida de Jesus se abateram sobre ele e foi a partir da busca de repostas para os próprios questionamentos que foram surgindo as pautas de aulas e artigos para o público universitário que ele publica neste livro.

É bom ler um autor que confessa suas dúvidas e que procura dirimi-las através da pesquisa. É esse perfil de pesquisador sério que o levou a escrever títulos como “Onde está Deus quando chega a dor?”, “Oração: ela faz alguma diferença?”,  “Para que serve Deus – em busca da verdadeira fé”. O leitor, identificando-se com o autor que confessa possuir as mesmas dúvidas que ele, é levado, depois, pela sua brilhante argumentação, ao encontro das respostas buscadas e ao conhecimento sublime de Jesus Cristo.

Confesso que, particularmente, a leitura me agradou pela profusão de referências históricas e literárias – característica que revela o estudioso de Comunicação e Língua Inglesa que o autor é, atento a filmes e ilustrações – o que permitiu a bela comparação realizada entre dois grandes escritores russos do século XIX, Tolstoi e Dostoievski, que levaram Yansen  a compreender o alto ideal apresentado no Sermão do Monte e que, inicialmente, lhe parecera impossível de ser alcançado (YANSEN, 2004, p. 148-55).

Entendendo as declarações contidas no Sermão como o âmago da mensagem de Jesus, Philip Yansen sentia imperiosa necessidade de apreender a extensão desse ensinamento (que lhe parecia exigente demais) a fim de não fracassar em  compreender Jesus. Curiosamente, da reflexão sobre a vida e a obra desses escritores russos resultou a compreensão buscada.

Tolstoi possuía um profundo respeito pelo ideal de Deus inflexível, absoluto, mas “seus ardentes avanços para a perfeição” nunca resultaram, para ele, em “paz ou serenidade”. Enquanto ele escrevia romances animados e luminosos e permanentemente buscava o auto-aperfeiçoamento, Dostoievski escrevia histórias “tenebrosas e taciturnas” e “esbanjava sua fortuna e saúde no álcool e no jogo”. Muito cedo escapou por milagre de uma sentença de morte e, justamente quando considerava uma mudança de vida, por percebê-la, subitamente, como muito preciosa, ganhou um Novo Testamento, único livro permitido na prisão para onde estava sendo levado. Ali, convivendo com bêbados, ladrões e assassinos, encontra material para criar seus personagens, mas, principalmente, consegue perceber a imagem de Deus no mais vil dos prisioneiros, entendendo que “apenas sendo amado” o ser humano “se torna capaz de amar”: “Nós o amamos porque Ele (Deus) nos amou primeiro”, como diz o apóstolo João.

Em Crime e Castigo, de Dostoievski, Raskolnikov, representando toda a desprezível raça humana, comete um crime também desprezível, mas através de Sônia, uma prostituta convertida, ele experimenta a graça de Deus e é levado à redenção.

Assim, pela análise da vida e obra desses dois grandes autores russos, Philip Yansen consegue resolver a tensão entre os elevados padrões do evangelho, revelados no Sermão do Monte, e a “triste realidade de nós mesmos”, que por nossa própria capacidade, nunca alcançaremos o ideal.

Diz o autor:

Com Tolstoi aprendi a necessidade de olhar para dentro, para o reino de Deus que está em mim. Vi como falhara miseravelmente nos elevados ideais do evangelho. Mas com Dostoievski aprendi a total extensão da graça. Não é apenas o reino de Deus que está em mim; o próprio Cristo habita ali. “Mas onde abundou o pecado, superabundou a graça”, como diz Paulo, em Romanos. (…) Somos julgados pela justiça de Cristo que vive em nós, não a nossa justiça. Tolstoi estava certo pela metade: qualquer coisa que me faça sentir à vontade com o padrão moral de Deus, qualquer coisa que me faça pensar: “Finalmente consegui”, é mentira cruel. Mas Dostoievski tem a outra metade certa: qualquer coisa que me faça sentir mal com o amor perdoador de Deus também é uma mentira cruel. “Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”: essa mensagem, Leão Tolstoi jamais captou completamente. (Op. cit., p. 154-5)

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A formação literária/linguística de Philip Yansey, além, é obvio, de seu profundo e verdadeiro conhecimento de Cristo, são diferenciais que me levam a indicar esta leitura, pois o distanciam de alguns gurus do meio evangélico que, por serem bons pregadores, se arvoram em publicar livros sem ao menos efetuarem uma boa revisão gramatical, certos de estarem a receitar verdades que serão facilmente assimiladas, mas que, lamentavelmente, muitas vezes, beiram fórmulas editoriais de auto-ajuda.

Ao analisar as palavras radicais daquele carpinteiro que vivia uma vida itinerante na Judeia, acompanhado por um bando de sujeitos grosseiros e sem estudo, Philip Yansey apresenta um personagem complexo que pode exigir um ideal elevado uma vez que é Ele mesmo quem se doa e que deseja mudar radicalmente nossas vidas.

O livro é dividido em três partes: “Quem Ele era”, “Por que Ele veio” e “O que Ele deixou para trás” e em todas elas o autor parece dar a mão ao leitor para juntos desfrutarem momentos de “prosa” (no sentido mineiro do termo) e de reflexão. Assim, mais claramente se apresentam aos nossos olhos os propósitos de Deus para a nossa vida de modo que a vivamos confiados em sua graça até que Ele volte, como prometeu que voltaria. Mesmo que essa vinda ainda demore e nossa vida chegue antes ao fim, que a vivamos em permanente expectativa, tal qual a senhora a quem Yansen se refere, no parágrafo final do livro, sepultada no interior do estado da Louisiana, em cuja lápide está escrita, segundo instruções que deixou, apenas uma palavra: “Esperando”.

 

Premiado diversas vezes, Philip Yansey (nascido em 1949) é um escritor e jornalista cristão americano. Seus livros venderam mais de 14 milhões de cópias e são lidos em 25 idiomas, pelo mundo todo. Desde 1992, vive com a esposa nas montanhas do Colorado, onde continua escrevendo.

 

Akiane Kramarik, pintora e poetisa de Illinois – EUA, é autora das telas que ilustram este post. Hoje, com 24 anos, é conhecida por ter experimentado desde cedo visões celestiais e um chamado de Deus para falar dele através de sua arte.  Aos dez anos, participou de uma entrevista do programa de tevê norte-americana The Oprah Winfrey Show, além de aparecer na rede CNN. Seu primeiro autorretrato foi vendido por 10 mil dólares.

A imagem em destaque nesta postagem é um detalhe da tela “O Príncipe da Paz”, de sua autoria.

 

Beijo&Carinho,

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Uma resposta

  1. Cultivar a religiosidade é uma tarefa útil, e o passar dos anos a faz ainda mais necessária. Cultivar algo significa não apenas plantar, mas também regar e podar, para que esteja sempre com vida renovada. Isso serve para as ideias tanto quanto para as plantas.
    O livro aqui citado é uma boa ferramenta para uma boa remexida no terreno da fé!
    Grato pela postagem.

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